Por Por que 'open bar' não deveria ser sinônimo de diversão

FOLHA


'Depois de um tempo, eu fazia meu próprio open bar. Começava a beber e já me tornava a pessoa mais rica da cidade' - maeching/Adobe Stock

Estava voltando da ginástica a pé, sentindo aquela energia boa do pós-treino. De repente leio numa placa: 'Beba à vontade por x reais'. Foi o que bastou para me despertar a lembrança das inúmeras festas open bar que fui na adolescência e começo da vida adulta. Era normal, as festas tinham de ter esse formato. Todo mundo ficava livre para beber o quanto quisesse, para valer o ingresso e a festa ser ainda mais 'divertida'.

Eu vivia em busca de comemorações desse tipo. Teve uma época que o bar que eu gostava estava com uma promoção de terça em dobro. Qualquer bebida alcoólica consumida dava direito a outra igual.

Lembro que no começo, Ju e eu saíamos do trabalho e íamos de carro para o bar. Achamos que podia ser perigoso e programamos ir de ônibus. Aí foi ladeira abaixo. A gente se acabava. No dia seguinte, era um tormento levantar para ir trabalhar. O corpo todo dolorido, dor de cabeça intensa e enjôo, mas lá íamos nós fingir que estava tudo bem. Tenho um pingo de saudade desse tempo em que esperávamos o fim do expediente para beber. Isso durou um tempo… até que a frequência foi piorando drasticamente.

Me lembro como se fosse hoje de uma Copa do Mundo. Mais precisamente, do jogo Japão x Brasil, quando eu, um colega de trabalho e minha melhor amiga na época fomos a uma pizzaria. A proposta do local era que eles serviriam chope e pizza durante o jogo. Antes e depois, não. Resultado: nos acabamos naqueles 90 minutos.

Tinha coisa mais gostosa do que estar com os amigos, ficar bebaça e ainda ter umas pizzas para beliscar? Depois do jogo, e foi então que a casa deve ter se arrependido, estávamos cantando em cima das cadeiras e pedindo mais bebida. Nem lembrávamos mais daregra. Sei que teve uma breve confusão e fomos expulsos do local. Algo bem corriqueiro nos meus anos etílicos.

Para falar a verdade, depois de um tempo, eu fazia meu próprio open bar. Começava a beber e já me tornava a pessoa mais rica da cidade. Pedia drinks sem parar, sem nenhum constrangimento. Mas acontece que depois de umas horas estava completamente inconveniente e era expulsa. Minha vida ficou um tempo nesse looping: beber muito e ser expulsa.

Daí que em inúmeras ocasiões eu ficava na sarjeta, sem saber direito o que estava fazendo ali. Amigos iam me acudir, tentar me levar para casa, nem sempre conseguiam. Uma vez combinei com uma amiga de ir a um restaurante português muito caro. Cheguei e a avisei que estaria lá. Disse que ia comer alguma coisa enquanto a esperava. Quando ela apareceu,eu estava sentada na frente do restaurante e os garçons a aconselharam a me ajudar a não beber. O marido dela ficou possesso de me ver naquela situação e brigou muito comigo. Estava anestesiada, não peguei nenhuma bronca para mim.

Tudo isso fui repassando na cabeça depois de ler a placa no bar. E daí refleti que festas deveriam ser sobre encontros, música, afeto e leveza. Mas, enquanto o open bar continuar sinônimo de diversão garantida, a ideia de celebração que depende do descontrole continuará sendo promovida. E, se as pessoas precisam perder o controle para sentir que participam, talvez não seja a festa que esteja errada, mas o modelo de alegria que foi imposto a todos.



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